terça-feira, 22 de julho de 2008

POEMAS



UM BEIJO
Luciano Nunes

Na calçada vi, deitado à elegância
Da socialite em foto de jornal
A ternura de um velho marginal
Que banhava-se de sol, sem petulância
Tinha ali por companhia a vigilância
De um rabugento cão, seu capital
Exibindo a cena, solidão e caos
Quando o velho, nobre em sua circunstância
Abraçou-se ao perro, amigo predileto
Sob a pressa de uns passantes fariseus
Fez um gesto vivo aos olhos de concreto
Dando beijos no seu cãozinho plebeu
E aquele instante vago e locupleto
Perguntou-se - Deus por quê? Por que, meu Deus?


O NARIZ EMPINADO
Luciano Nunes


Não empines tanto assim o teu nariz
Lança as vistas sobre o campo, olhai os lírios
É preciso a temperança dos delírios
Pra manter-se à corda bamba, o aprendiz
E se lá no fim do túnel, chão de giz
Encontrares, pouca luz, ou nenhum círio
Com os mesmos olhos nus dos teus martírios
Compreenderás, nada reconstituís
Não empines teu nariz além das horas
Deixa pois o teu silêncio atravessar
A caligem dos instantes, corrobora
Que assim é bem mais doce navegar
Percebendo que o tempo nunca ancora
Segue sempre o seu galope a beira-mar.




O SANGUE DOS VATES UNIVERSAIS.
Luciano Nunes

Quando La Luna abracei
Em Dante achei o meu rumo
Florbela escrevendo Fumo
Cecília e Ricardo Reis
Na rima me transportei
Pr’os sertões transcendentais
Com Pinto nos arraiais
Encontrei praias e mangues
Os meus versos tem o sangue
Dos vates universais.

Maiakoviski, tem Dylan
Tem Rilke e tem Zé Limeira
Nos dedos da minha caveira
O EU de Augusto dos Anjos
Whitman tocando banjo
Com Vinícius de Morais
Baudelaire e Octavio Paz
Gregório é o chefe da gang
Os meus versos tem o sangue
Dos vates universais

Machado e Guimarães Rosa
Tem Clarice e Gabriel
Van Gogh, Felini e Buñel
Poetas de cores e prosa
A arte, essa égua fogosa
nos campos filosofais
dos poetas marginais
que explodem seus big-bangs
Os meus versos tem o sangue
Dos vates universais

Tem Gil, Cartola e tem Chico
Zedantas e Humberto Teixeira
Cordéis vendidos na feira
Tem Londres e Caruaru
De Borges, Cabral e Xudu
Ao rap dos Racionais
A lista não acaba mais
Eu gosto quando ela se expande
Pois meus versos tem o sangue
Dos vates universais.



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